Se 2015 é amanhã

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Se 2015 é amanhã, a bola está com o governo

Em 2015, vencem inúmeras concessões no setor de energia elétrica. O principal interessado no assunto, o governo, ainda não se manifestou

Elena Landau*, O Globo
09 de julho de 2009

Em 2015 vencem inúmeras concessões no setor de energia elétrica e o principal interessado no assunto, isto é, o governo, ainda não se manifestou formalmente. O tema interessa ao governo porque, mantidas as regras atuais, grande parte dos ativos pertencentes às empresas estatais deverá ser licitada em obediência ao artigo 175 da Constituição Federal.

O silêncio do governo é ainda mais surpreendente quando se sabe que a decisão sobre o tema, isto é, prorrogar ou licitar, é política, em vista da resistência do Congresso a qualquer possibilidade de se reviver o programa de desestatização. Por isso, a opção pela prorrogação parece ser a mais provável. Tal resistência dos parlamentares à privatização é por sinal inexplicável, pois ela trouxe grande melhoria nos serviços públicos e continua sendo utilizada pelo governo atual tanto para leilões de energia nova, como nas concessões de outros serviços, como rodovias. Mas o apoio do Congresso é crucial, pois, se a prorrogação for de fato o caminho escolhido, certamente será necessária uma mudança legislativa, ou mesmo uma emenda constitucional para contornar a limitação imposta pelo dito art.175.

No silêncio do Executivo, o setor privado, através de associações que representam a indústria, vem se debruçando sobre o tema, buscando soluções e fazendo sugestões sem, contudo, chegar a uma posição de consenso em torno da prorrogação. Há no setor de energia grupos interessados em expandir seus ativos através das esperadas licitações de 2015, e há também aqueles que desejam a prorrogação. Ainda que correndo o risco de simplificar em demasia a questão, pode–se afirmar que há dois pontos que unem a indústria: o desejo de segurança jurídica, e, portanto, maior clareza das regras em torno do tema o mais rapidamente possível, e que o processo, seja de prorrogação seja de licitação, contribua para a modicidade tarifária. Mas não há uma proposta única de como atingir tais objetivos. Pode–se dizer que a indústria está dividida.

A questão é essencialmente política porque, se não houver a possibilidade de prorrogação, o governo federal pode perder grande parte de seus ativos para o setor privado através de processo de licitação. Note-se que este seria um movimento muito diferente da privatização da década passada, quando foram leiloadas ações que representavam o controle do capital da empresa como parte de um programa de governo que previa exatamente a sua retirada da atividade econômica. Naquela ocasião, foram transferidos ao setor privado, além dos ativos diretamente ligados à concessão, as dívidas, os empregados, outros ativos imobilizados e assim por diante. Na situação atual, caso seja feito um leilão para cada usina pertencente a uma concessionária, pode acontecer, na hipótese extrema de uma empresa estatal perder todas as concessões, que ela ainda permaneça com os empregados, as dívidas e toda sua estrutura administrativa. Tratando–se de empresas estatais o ônus dessa possibilidade recairia sobre o contribuinte.

Assim, na venda isolada de ativos seria necessária a vinculação de cada um deles a uma parcela desses elementos de custos para que, ao final do processo, não restasse uma empresa esvaziada de ativos e cheia de encargos. Esse procedimento contábil, todavia, não é simples.

No contexto atual, algumas adaptações ao programa de desestatização, no entanto, seriam necessárias. No passado, havia uma enorme restrição fiscal, o que implicou a venda das empresas pelo critério do maior preço pago pelo ativo, sem se cuidar da questão tarifária. Além disso, pela mesma razão, as empresas de controle público estavam impedidas de participar de leilões. Hoje, a prioridade do governo parece ser outra, e por isso esta limitação não é factível do ponto de vista político. Além disso, é preciso definir um sistema que priorize a modicidade tarifária.

De todo modo, esse cardápio de opções já vem sendo discutido há meses pelo setor privado, o importante agora é que o governo defina o caminho a ser seguido, pois a incerteza regulatória termina por paralisar novos investimentos, prejudicando, em última instância, o usuário desse serviço público pela falta de aporte de recursos tanto em manutenção quanto em expansão do sistema elétrico brasileiro.

O ano de 2015 parece distante, mas não o é quando se leva em consideração que planos de investimentos em infraestrutura são concebidos e implementados em longo prazo. É importante ressaltar que as opções a serem buscadas pelo poder público devem levar em consideração a busca de maior eficiência para o sistema como um todo, conciliando os objetivos de modicidade tarifária, prestação de serviço adequado e expansão da oferta de energia.


* Elena Landau é economista e foi diretora de Desestatização do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).


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