O charme dos estaduais

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O charme dos estaduais

Recebi uma avalanche de mensagens contestando minha preferência por campeonatos estaduais e um Rio-São Paulo mais enxuto

Elena Landau*, Site no.com.br
1º de fevereiro de 2002

Recebi uma avalanche de mensagens contestando minha preferência por campeonatos estaduais e um Rio-São Paulo mais enxuto. Ninguém me convenceu, mas acho que também não conseguirei convencer ninguém que discorda de mim. Afinal, confesso, minha preferência pelos estaduais está escorada principalmente na emoção. Eu prefiro e acho infinitamente mais charmoso ver meu time ser campeão de um estadual. É argumento de torcedora. O Rio-São Paulo tem seu charme. Mas carece de tradição (é torneio que vai-e-volta) e, por isso mesmo, ainda incapaz de estabelecer rivalidades arrebatadoras – como Flamengo e Vasco no Rio ou Corínthians e Palmeiras em São Paulo.

Eu acho que uma das graças do futebol, além de ver seu time marcar gols e ganhar campeonatos, é justamente a de celebrar a miséria de um adversário. Se for um arqui-rival então, melhor ainda. Na minha opinião, esse sentimento não tem a mesma força se a vitória aparece contra um time de outra cidade. Me dá um vazio, uma certa sensação de desperdício. De qualquer forma, essa é uma discussão em aberto e só o tempo vai responder quem tem razão.

Gosto muito do carioca, mas, por favor, não confundam esta minha paixão com um apoio velado ao Caixa D´Água – Eduardo Vianna na certidão de nascimento – presidente da Federação do Rio e a quem os cariocas devem uma boa parcela do estado calamitoso em que o futebol se encontra no Rio de Janeiro. Vianna esta semana voltou novamente a aparecer na crônica policial da cidade, acusado por ex-funcionário da entidade que dirige de patrocinar desvio de renda e de dinheiro da Federação. Sorte dele é que as chamadas autoridades competentes parecem concordar com a visão dos cartolas, de que é inconstitucional qualquer investigação nas Federações porque elas são autônomas.

Essa polêmica sobre a autonomia das entidades esportivas está lembrando o debate sobre imunidade parlamentar. Fica difícil defender um e outro quando se trata de crime comum. Os cartolas argumentam que não podem ser investigados não só porque isso fere o princípio constitucional de autonomia como também ameaça a participação do Brasil na Copa, pois os estatutos da Fifa também demandam a tal autonomia nas organizações que regem o futebol dos países a ela afiliados. Será que o governo acredita mesmo que, por conta de um pente fino no futebol para livrá-lo de práticas criminosas, a Fifa, cujo presidente está sob investigação pela falência da ISL, vai ter coragem de vetar a presença do Brasil num Mundial? Pior do que a falta de diligência investigativa das autoridades, só mesmo o eterno silêncio dos presidentes de clubes. Afinal, os clubes são os mais prejudicados com esta evasão de renda.


Torcida organizada

Recebi uma mensagem de um integrante de uma das torcidas organizadas do Botafogo. Ele reclamava que Bebeto de Freitas havia reduzido o número de ingressos cedidos às organizadas. Disse que o Botafogo já era, antes da chegada de Bebeto, o clube carioca que pior tratava sua torcida nesse quesito, o da doação de ingressos.

O tema “torcida organizada” é muito importante. São elas que garantem o apoio ao time, mesmo naquelas horas onde o clube fica tão em baixa que a tendência geral da galera é saudá-lo com um silêncio sepulcral. São elas também que não se darão jamais o luxo de ficar em casa no ar condicionado – o que se tornou tentador depois da reforma do Maracanã tê-lo transformado em uma sauna pública-, tomando sua cervejinha e acompanhando o jogo pela televisão, mesmo quando o jogo é em algum estádio no fim do mundo, o que é cada dia é mais freqüente.
Pela importância das torcidas organizadas no espetáculo do futebol e no apoio apaixonado aos times, não tenho dúvidas de que elas de fato merecem apoio do clube. Mas sou contra qualquer tipo de apoio que ajude a esburacar ainda mais a combalida receita de que os times tanto dependem, ou que joguem as torcidas organizadas diretamente dentro da gestão dos clubes.

Na minha visão, doação de ingresso é o tipo de ajuda que se encaixa nestas duas categorias.
De uns anos para cá, temos assistido uma crescente participação das torcidas na administração dos clubes. Os exemplos são muitos e variados na sua natureza: apoio político nas eleições, participação nas diretorias, invasão de campo, agressão aos jogadores. Ou seja, está longe o tempo em que torcida organizada significava apenas bandeiras, batucada, hinos e muita paixão. Hoje tem mais grito de guerra e violência inclusive entre fações de torcida cujo coração bate pelo mesmo time. As organizadas fazem parte da disputa política pelo poder nos clubes.

A redução do número de bilhetes distribuídos certamente não significa que Bebeto de Freitas não reconhece a importância da torcida organizada, mas simplesmente a necessidade de reduzir os prejuízos do Botafogo. Dependendo do público pagante é normal que os clubes do Rio paguem para jogar no Maracanã. Sou da opinião que todos devem pagar ingresso: dirigentes, políticos, artistas e torcedores. A prática de distribuição gratuita de ingressos, seja para torcida seja para o chamado público VIP, no fundo é a grande fonte de bilhetes vendidos por cambistas.

Os torcedores ajudariam muito seus times se recusassem a oferta dos cambistas. É um belo passo rumo à restauração das finanças do futebol. Os clubes podem e devem apoiar suas organizadas – contribuindo com bandeiras, camisas e até ajudando na viagem – mas dentro de critérios claros e sem ameaçar suas já magérrimas receita. Os clubes também deveriam recompensar suas torcidas por bom comportamento.

* Elena Landau é economista e botafoguense

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